Página de cultura do Diário do Grande ABC Edição de 05 / março / 2018 |
Dificilmente quem foi criança dos anos 1970 para cá não tenha se deparado com a figura de um garoto com uma panela na cabeça, ilustrado no livro de 1980 O Menino Maluquinho, ou lido a história da cor diferente que não se encaixa no arco-íris e em lugar algum, como acontece em Flicts, lançado em 1969, e que apresenta forte crítica ao preconceito. Isso sem contar com as publicações do humorístico O Pasquim, que serviu também para combater a ditadura militar brasileira.
O que há em comum entre tudo isso é o mineiro Ziraldo, nascido em Caratinga. Escritor, ilustrador, chargista e grande comunicador, entre outras denominações, ele, que completou 85 anos em 24 de outubro, ganha agora bela homenagem pela data e por toda a influência que exerce em tantos e tantos profissionais com o livro Ao Mestre com Carinho: Ziraldo 85 no Traço de 85 Talentosos Cartunistas (Editora Melhoramentos, 192 páginas). A obra acaba de chegar às lojas.
Com curadoria assinada por Edra, ilustrador conterrâneo do homenageado, a obra apresenta 85 artistas, entre brasileiros e do Exterior, que preparam caricatura de Ziraldo, cada um à sua maneira. E entre os escolhidos estão os ilustradores do Diário Seri e Fernandes. A obra conta ainda com textos de Zélio, irmão de Ziraldo, do curador, de Jal e também de Jô Soares.
“Fico feliz em reunir uma seleção de artistas da melhor estirpe”, afirma o curador, que passou um ano e dois meses debruçado no projeto. “É a homenagem de um público atrelado à sua vida profissional. O mais complicado foi juntar todo mundo. É um desafio muito grande, mas em compensação, uma homenagem imensa”, diz Edra.
Com 38 anos de experiência, Seri, ilustrador do Diário, conheceu o trabalho de Ziraldo quando iniciou na profissão. “Comecei a pesquisar as publicações marginais e ele era um dos fundadores de O Pasquim”, diz. “Foi um dos que ajudaram a conscientizar as pessoas na época da ditadura militar”, explica.
Para desenhar Ziraldo, Seri pensou de imediato no Menino Maluquinho. Se para ele Henfil (1944-1988) foi o maior chargista brasileiro, Ziraldo é o maior artista gráfico que já viu. “Tanto para quem começou na profissão há tempos quanto para quem começa agora, não há como não ter influência de Ziraldo. É muito especial ver meu nome no livro que faz parte da história dele.”
Fernandes, também do Diário, conheceu o trabalho de Ziraldo cedo, aos 13 anos. Ele era funcionário de uma banca de jornal quando se deparou com uma edição de O Pasquim e depois, na metade da década de 1970, com quadrinhos de A Turma do Pererê. Em sua homenagem, o artista de Santo André imaginou Ziraldo usando colete. “É a marca dele”, conta. Fernandes diz que algo que chama a atenção no risco do homenageado é que é muito linear. “Nunca vi nada ruim dele. Está sempre inspirado. Parece que nunca brochou (em referência à famosa entrevista de Ziraldo a Ruy Castro para a revista Playboy em 1980, na qual dizia nunca ter ‘falhado’ com uma mulher). Ele economiza no traço e coloca o que é mais importante no trabalho. Ziraldo é o papa da ilustração no Brasil.”
GRANDES NOMES
Além dessas, outras caricaturas dão vida às páginas, ilustradas também por textos biográficos. Estão lá trabalhos de nomes como Baptistão, Mauricio de Sousa, Dálcio Machado, Leite, Chico e Paulo Caruso, entre tantos outros. E há, inclusive, mais gente do Grande ABC, como é o caso de Rui Miranda e Humberto Pessoa, que são de São Bernardo, além de Abel Costa, de Santo André.
Costa escolheu fazer sua homenagem em mídia digital e apresentou desenho preto e branco para o livro. “Apesar de ser mídia digital, recorda um pouco o trabalho cheio de simplicidade, feito com lápis. É como vejo o legado do Ziraldo, uma grande recordação da essência, quando ainda não existia toda essa tecnologia. Tudo o que era feito tinha a característica de ser ‘com tinta’ mesmo”, explica o artista. “Me sinto muito honrado de participar de homenagem ainda feita em vida ao Ziraldo. Ele merece.”
Já Miranda, em seu trabalho, optou retratar um dos livros do homenageado, ao brincar com Ziraldo e o Saci, personagem do folclore brasileiro que está nas páginas dos quadrinhos A Turma do Pererê. “Ele cria suas obras desde a infância. E criança é arteira, pega um sabugo de milho e acha que é foguete. Por isso pensei em juntar e fazê-lo arteiro. Estou muito orgulhoso em poder participar desse livro histórico”, explica o artista.
Pessoa também se enche de orgulho por fazer parte do projeto. Assim como Fernandes, ele apostou no colete em sua caricatura e aproveitou para ilustrar a peça com personagens criados pelo aniversariante. “São partes dele, são a pele do Ziraldo”, explica. O artista de São Bernardo afirma ainda que, assim como para tantos outros cartunistas, Ziraldo é referência para ele também. “É um dos mais importantes e influentes do Brasil.”
Fonte: Vinícius Castelli / Diário do Grande ABC
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